Biografia, eis a questão

“Não há possibilidade de a gente tratar de nada hoje sem que nos reportemos ao quadro político em que vivemos agora, que é um quadro de estado de exceção”. Com essa frase contundente e sob aplausos, o escritor, jornalista e político baiano Emiliano José iniciou, na tarde deste domingo, 19, sua participação no Rota da Palavra VII na Fligê 2018 em Mucugê.

Emiliano e o jornalista Camilo Vanucchi debateram o tema Obra biográfica: os limites da ficção, mediados pelo também jornalista Rogério Oliveira, neste último dia da Feira.

Ambos biógrafos, Emiliano e Camilo conversaram com o público sobre suas obras e sobre o estilo literário como forma de resistência aos obstáculos históricos e sociais impostos aos personagens retratados por eles pela realidade que os circundam.

“A biografia é literatura de resistência quando a gente consegue construir uma memória, uma verdade, um testemunho. Esse testemunho tem o papel de contrapor com uma versão oficial, uma versão legalista, que teria sido construída no momento em que a história se fez. Eu acho que esses personagens que a gente conta, eles transitam muito neste território, eles eram questionados, criminalizados em seus momentos, eles eram os bandidos. E não é esse o olhar que compartilhamos e que colocaríamos em suas biografias à luz dos dias de hoje, com o conhecimento histórico que temos dos fatos da época”, relata Vanucchi, que é biógrafo oficial da ex-primeira-dama do Brasil, Marisa Letícia Lula da Silva.

Vanucchi também foi o responsável por escrever o último capítulo do livro do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, A verdade vencerá: o povo sabe porque me condenam, lançado em março deste ano e best-seller no Brasil.

Emiliano José é autor da biografia sobre o ex-governador da Bahia, Waldir Pires, lançada no último mês de junho e apresentada na Fligê pela primeira vez. O escritor também é o responsável pela publicação de mais 12 livros, dentre eles biografias de importantes nomes da história do Brasil como Carlos Lamarca, Carlos Mariguella e o Padre Renzo Rossi.

Para ele, a verdade é a essência do trabalho do biógrafo e ela norteia o seu trabalho ao longo de muitos anos, mesmo após a conclusão de uma obra, pois “nossos trabalhos não são livros finais, porque nós estamos escrevendo à quente, não estamos escrevendo cem anos passados”.

“O nosso trabalho não é um trabalho desinteressado, não é um trabalho do intelectual que paira sobre as nuvens. Nós temos o compromisso com a verdade e quando eu faço o Lamarca ou o Mariguella ou o Padre Renzo, os problemas, as dificuldades, os erros e os equívocos, eles aparecem”, explica José.

Sobre essa concepção do gênero biográfico Vanucchi relata que a construção da escrita literária da biografia não se atém apenas a fatos colhidos em entrevistas, muitos deles são descritos por testemunhas, o que exige a imaginação do autor e toda a sua criatividade na escrita para relatá-los, ciando, assim, momentos de ficção em suas obras.

“Eu e o Emiliano, a gente escreve a biografia de um jeito que outras pessoas não escrevem, a gente põe diálogos, diálogos que a gente não presenciou, que a gente apenas ouviu de uma das personagens que estava lá presente. Mesmo assim, a gente escreve esse momento, meio que imaginado em nossas cabeças. Eu percebo que esse é o momento em que a gente está cruzando aquela linha divisória entre a biografia e a ficção”, descreve.

Ao final do evento, os autores concederam autógrafos aos participantes, prometendo retornar à Fligê do próximo ano com seus novos livros. Emiliano com o volume 2 da biografia de Waldir Pires e Camilo com o livro já finalizado sobre Marisa Letícia.

Texto: Débora Silveira | Fotos: Lari Carinhanha


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